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FICÇÃO CIENTÍFICA - FANTASIA - TERROR.
quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Os Últimos Dias da Terra - Capítulo I
A primeira vez que Amanda Hall havia sido raptada, ela tinha apenas 7 anos, e ficou uma semana convivendo com seus raptores. Ela estava tão assustada que mal olhava para o rosto deles. Mais tarde, quando ela não conseguiu fazer um retrato falado para a Auditoria, disseram que ela estava protegendo-os.
"Você está com Síndrome de Estocolmo", seu psiquiatra disse, uma vez. Ele explicou o que era. Ela atirou um peso de papel na cabeça dele.
Desta vez, seria diferente, ela não era mais uma criança assustada. Em silêncio, ela observava seus captores enquanto eles discutiam, atenta a alguma oportunidade de escapar. O primeiro, o piloto do helicóptero que a levou até ali, tinha olhos azuis, cabelos loiros, sobrancelhas quase unidas na testa. Ela disse para si mesmo estes detalhes, para ter certeza que saberia repetí-los para a auditoria. Ninguém ia dizer que ela estava com síndrome nenhuma.
Ele havia arrastado ela pelo braço para fora do helicóptero, assim que pousaram, e jogado ela com força no chão. Ela raspou os joelhos e as palmas das mãos, mas não gritou.
O segundo ela acabara de conhecer, e estava concentrada em observá-lo, olhando ainda do chão, tentando absorver todos os detalhes de seu rosto. Ele parecia ser o chefe. Seu rosto era magro, ele era alto, olhos negros, pele um pouco mais escura, como a dela. Talvez também tivesse antepassados latinos. Ele estava discutindo com o primeiro.
- Ei, calma lá, é só uma criança. E o que você fez no rosto dela - o rosto de Amanda ainda estava machucado, doendo. Pelo visto, os tapas que o primeiro bandido havia lhe dado, no helicóptero, estavam ainda visíveis.
- Criança? Esta pivete quase matou a nós dois. Olhe o que ela fez comigo - o primeiro abriu o casaco, mostrando uma grande mancha de sangue na roupa - juro que se o chefe não quisesse tanto ela, tinha jogado lá de cima, que é o que ela merecia.
- Deus do céu! Esta criancinha fez isto. O que ela fez, bateu em você com o urso de pelúcia dela?
- Ela tinha uma faca, e cravou em mim quando estávamos chegando. Acho que não foi muito fundo, mas por pouco não caímos. Agora você fique com ela, por sorte meu trabalho termina aqui - o primeiro homem se virou de volta para seu helicóptero.
- Você deixou que ela trouxesse uma faca escondida?
O piloto se virou para responder, ao pé de seu helicóptero, imediatamente antes de subir no mesmo - ah, sim, eu deveria tê-la revistado, eu suponho. Afinal, todas as crianças levam uma faca escondida em suas botas, quando saem de casa com suas babás - Amanda sentiu um certo orgulho ao ouvir isto, e deixou escapar um sorriso. "Fui burra, devia ter tentado o pescoço", ela pensou em silêncio.
O segundo homem se abaixou, de forma a ficar na altura dela, e olhou direto em seus olhos.
- Amanda Hall, o que você fez foi muito, muito estúpido. Foi sorte Taylor não tê-la jogado lá de cima, como ele ameaçou. O que você achou que ia fazer, matá-lo e pilotar o helicóptero?
Amanda encolheu os ombros, em resposta. Não tinha realmente pensado a respeito.
- Ouça, acho que começamos com o pé esquerdo. Pode não parecer, mas estamos, na verdade, protegendo sua vida. Acredite em mim, a última coisa que você gostaria, agora, era de ainda estar em Nova York. Está começando uma guerra, e a cidade é um alvo principal.
Amanda permaneceu em silêncio, imóvel. "Ele tem uma arma na cintura", ela pensou, "se ele se distraísse, talvez eu pudesse pegar ela e atirar nele".
- Nós vamos pegar um jato, agora, e viajar até a costa oeste. Seremos só eu e você, eu vou estar pilotando e você vai estar do meu lado. Você pode ir solta sentada na poltrona do copiloto, ou amarrada nela. A pergunta é: você vai tentar fazer alguma coisa estúpida que vai acabar matando nós dois?
"Provavelmente", Amanda pensou, mas balançou a cabeça em um sinal de não.
- Ótimo. Eu sei que você está assustada, mas vai ficar tudo bem. Alguém gastou muito dinheiro para garantir que você chegaria em um lugar seguro.
- Já vi que você não é de muitas palavras - o homem continuou - Bem, meu nome é Walker - ele estendeu a mão - venha, deixe-me ajudá-la a se levantar.
Amanda se levantou sozinha, ignorando sua mão, e então começou a falar, uma frase por sobre a outra - eu já fui raptada antes, e eles foram muito gentis, e todo mundo achou que eu estava com síndrome de estocolmo, mas eu não estava e quando eles foram presos e condenados a cadeira elétrica eu pedi para assistir, mas não deixaram porque eu era muito pequena, mas aposto que vão deixar quando pegarem você, e eu vou rir da sua cara quando você for torrado - e então se encolheu, esperando por um soco ou tapa, que não veio.
Walker balançou a cabeça e soltou um suspiro - venha, o jato fica nesta direção.
- Nova York não existe mais - Ele falou, e esperou a reação da criança, mas não houve nenhuma - Meu velho ia estar rindo de mim, agora. Ele ia me dizer que a característica mais irritante de Andrey é que ele sempre está certo.
A criança não olhou para ele. Estava de braços cruzados na poltrona a seu lado, olhando para o vazio. A mesma posição que ficara na última hora.
Walker continuou mesmo assim.
- Eu não acreditei quando Andrey me disse que a guerra ia começar de verdade, não lá no fundo. Mas ele estava certo. As coisas vão ficar difíceis agora, realmente difíceis.
Walker olhou para a garota e ficou esperando uma resposta, uma reação.
- Você está me escutando? Você entende o que está acontecendo? Nova York não existe mais, nem Washington, não sei quantas outras cidades. Os comentários são confusos - Walker apontou para seu ouvido, para o implante do rádio - mas a grande guerra começou. Você vai precisar entender o que isto significa.
- Significaria que a República Asiática iniciou um ataque nuclear em larga escala. Teríamos na América o mesmo que aconteceu na Europa em 65 - a criança por fim quebrou o silêncio - Mas eu não acredito em você. Você só quer que eu fique com medo e não tente fugir, e que fique agradecida por terem me raptado.
Tendo falado, a criança cruzou novamente os braços e ficou em silêncio.
Walker não disse nada. Apenas selecionou mentalmente um fluxo e a filtragem e colocou para passar na tela da frente da criança. Eram tweets naquele momento, pequenos textos de duas linhas, com relatos dos ataques, intercalados com comandos do Governo para as pessoas manterem a calma.
- Está lendo? - Walker perguntou - Acredita em mim agora? Eu estava na Europa, em 65, e, acredite, fui muito pior que qualquer coisa que tenham contado.
A criança encolheu os ombros, ainda sem olhar para ele. A voz dela era fria quando falou - não tinha ninguém que eu gostasse em Nova York.
O deserto ainda estava inalterado, silencioso. O sol que nascia no horizonte bem poderia estar anunciando um dia como qualquer outro. Era como se ele fosse tão maior, tão mais antigo que a humanidade, que nem dava importância a suas lutas. As guerras dos homens não eram capazes de tocá-lo.
Não havia nenhuma cidade ali, naquela parte do deserto, e nenhuma construção que se levantasse mais de alguns metros acima do solo, mas haviam pessoas. Centenas. Guardas e criminosos, dividindo um mesmo espaço, em uma prisão construída no subterrâneo.
Todos eram prisioneiros agora, ou refugiados. Alguns ainda queriam partir, tentar se reunir com suas famílias, talvez tentar fugir para algum lugar seguro. Os mais inteligentes sabiam que não havia muitos lugares na terra mais protegidos que uma prisão subterrânea no meio de um deserto. Estes, independente de estarem do lado de dentro ou de fora das celas, sabiam que não encontrariam um lugar mais seguro.
O homem que aguardava, com visível impaciência, para ser atendido pela diretora da prisão, era um dos poucos homens inteligentes que não compartilhava desta percepção. Na verdade, ele estava tão ou mais decidido a sair que praticamente qualquer outra pessoa ali.
- Eu consegui 5 minutos com ela, Andrey, mas não sei o que vai adiantar. Ela não gosta mesmo de você, ainda mais agora. Acho que você é a última pessoa que ela gostaria de ver.
- Estou acostumado que não gostem de mim - Andrey respondeu para o guarda, e entrou pela porta que este havia saído. Uma mulher de pouco mais de trinta anos estava atrás de uma escrivaninha, concentrada, os olhos fixos nas imagens projetadas em sua mesa. Ela pareceu nem perceber sua entrada. Andrey caminhou até a cadeira oposta a escrivaninha e se sentou.
- Os 5 minutos de seu tempo, Elisa, são suficientes, mas preciso de sua total atenção.
- Para você, é Diretora Hall, Senhor Gustav, e não há necessidade de gastarmos 5 minutos. O que quer que você queira, a resposta é não.
- Eu quero, Diretora Hall, que autorize minha saída e me ajude a chegar na costa oeste nas próximas 2 horas. Um helicóptero seria conveniente, mas se conseguirmos um jato será melhor.
- Você está delirando? Ou ainda é parte de sua encenação de insanidade? O mundo está acabando. Alguém resolveu terminar o trabalho que você e seus amigos começaram em 65, e desta vez é realmente o fim. Um fim que você vai enfrentar junto com todos nós, Gustav. Com 20 anos de atraso no seu caso, mas desta vez nenhuma saída milagrosa vai salvar seu pescoço enquanto bilhões morrem.
- Eu adoraria discutir isto, minha cara, mas você só me deu cinco minutos, lembra? Quatro agora. Como eu disse, preciso chegar a costa oeste em 2 horas, e acredito que você é a única pessoa com autoridade suficiente para conseguir isto para mim. Afinal, sua corporação colocou você como chefe aqui, não é verdade? Você deve ter alguns recursos a sua disposição...
- E você veio me pedir ajuda para se esconder em algum buraco até tudo isto passar? - a Diretora se levantou de sua cadeira, sua voz finalmente se alterando, os olhos faiscando de fúria - desta vez não vai passar. Desta vez não há buraco fundo o bastante para você se esconder. O planeta inteiro vai morrer, e nós todos vamos morrer com ele. Inclusive você.
- Eu não vim para pedir ajuda, Diretora Hall. Eu vim contratá-la. Eu quero que trabalhe para mim. Eu quero que me ajude a chegar na costa, onde há uma nave esperando para nos levar para fora deste planeta. Podemos considerar esta tarefa seu teste de admissão, e passagens na nave o adiantamento de seu primeiro salário. Que lhe parece?
- O que me parece? Que você está completamente louco, ou que é tão arrogante que não consegue aceitar a ideia de que vai morrer junto com todos nós. Não há como sairmos daqui, não há como chegarmos onde quer que você tenha escondido esta nave, se é que ela existe, nem algum lugar para onde irmos com ela. Você vai morrer, Andrey, da mesma forma que todos nós, e mesmo que eu pudesse impedir isto, sinceramente acho que prefiro abrir mão desta sua 'passagem', só para vê-lo seguir no mesmo destino de todas as suas vítimas.
- Quanto desejo de morte, minha cara. Será que isto tem alguma relação com o fato de sua filhinha ter se tornado, algumas horas atrás, um punhado de pó na estratosfera junto com todos os habitantes de Nova York?
- Seu bastardo, você não tem o direito.
- Felizmente para nós dois, minha cara Elisa, e só estou tomando a liberdade de chamá-la assim em face de nosso futuro relacionamento, minhas ofertas de emprego são muito persuasivas, e raramente não são aceitas - dizendo isto, Andrey puxou um pequeno objeto de seu bolso e o jogou sobre a mesa.
- O que é isto?
- Um telefone. Não é um rádio ou um celular exatamente, opera de outra forma, mas no fundo serve para a mesma coisa. O que importa é quem está do outro lado da linha. Ela esta um pouco assustada, lamento dizer, mas está ansiosa para conhecer o espaço ao lado de sua mãe. Claro, a nave só vai partir quando chegarem os dois últimos passageiros, mas eu tenho certeza que você vai achar uma forma de nós levar até lá.
Benjamin bebia o café de forma automática, sem sentir o gosto, apenas pela cafeína e para sentir alguma coisa quente descendo em sua garganta. Ele não sentia mais sono, a adrenalina deixando-o mais desperto do que nunca. Foi o que disse para sua assistente, enquanto ambos caminhavam, em passos rápidos.
- Qual foi a última vez que o senhor dormiu? Ontem? Anteontem? Descanse pelo menos uma hora após esta reunião, iremos acordá-lo se acontecer qualquer coisa nova.
- Coisas novas estão acontecendo o tempo todo, mais rápido do que podemos lidar - ele disse imediatamente antes da porta a sua frente se abrir. Dentro, uma dúzia de pessoas trabalhavam, algumas sentadas em mesas, manipulando hologramas no ar, visíveis apenas para eles. Quatro estavam discutindo em um canto ao lado de uma parede, toda ela uma enorme tela com diagramas e estatísticas. Uma das pessoas se dirigiu a eles assim que entraram.
- Benjamin, não precisava ter vindo. Teríamos ido ao comando central, só estavamos esperando que nos avisassem quando tivesse um tempo.
- Eu tenho tempo agora, e preciso de respostas clara - Benjamin respondeu sem parar de caminhar, indo na direção da pequena sala de reuniões do laboratório, certo que o doutor Ruiz e Emma, sua assistente, o acompanhariam.
Dentro da sala ele ficou em pé, recusando a cadeira que Emma lhe ofereceu. Ele queria deixar claro que o encontro seria rápido. Não havia tempo a perder.
- Eu tenho 176 pessoas a bordo, doutor, que estão a beira do pânico, e preciso dar respostas claras a elas. Temos previsão de quando será seguro começar a transportá-las para a Terra?
- Estamos analisando os dados continuamente, comandante. Eu receio que as perspectivas não são boas.
- A costa leste inteira não existe mais. Não creio que alguém ache que as perspectivas são boas, doutor.
- Bem, sim, claro. Eu receio que o problema vá um pouco além disto. Estamos prevendo um inverno nuclear tão longo quanto o de 65 e 66. Talvez pior.
- Então, ou descemos elas e conseguimos levar para um abrigo, ou teremos que esperar pelo menos um ano?
- Isto. Talvez no hemisfério sul não seja tão ruim, pelo menos nas primeiras semanas, mas creio que o melhor seria esperarmos 12 meses, até o inverno passar e a temperatura retornar ao normal. Temos condições de aguentarmos este tempo sozinhos, não temos?
- É o que vou descobrir agora - e Benjamin saiu da sala, despedindo-se do doutor Ruiz, caminhando tão rápido como quando entrou, sua assistente quase correndo em suas passadas curtas para conseguir acompanhá-lo.
Não demorou mais de alguns minutos para ele chegar ao próximo laboratório.
- Doze meses? - o homem baixo, os poucos cabelos já brancos, coçou a cabeça antes de responder - tem certeza que precisaremos ficar todo este tempo aqui?
- Estou partindo deste pressuposto. Quanto tempo conseguimos ficar sem suprimentos e apoio da Terra?
- Doze meses, com certeza. Até um pouco mais, se for realmente necessário, mas teremos que racionar. 15 meses talvez, 18 no máximo, mais que isto seria impossível com tantas pessoas a bordo. Mas ninguém vai gostar de ficar mais tempo aqui. Todo mundo tem algum familiar lá embaixo, e está difícil obter alguma notícia. Não podemos começar a levar pelo menos alguns para a costa oeste, ou pelo menos para a América do Sul?
- Talvez em algumas semanas, se as coisas não piorarem. Mas o Doutor Ruiz está dizendo que vamos ter outro inverno nuclear, tão ruim quanto o de 65.
- Benjamin? - a voz assustada os interrompeu. Emma estava com a mão direita no ouvido, encostando no comunicador implantado, o rosto branco - tem mais uma nave chegando. Mas é da república Asiática, e acho que está armada.
No espaço, orbitando ao redor de um planeta agonizante, o satélite tripulado "dragão celestial" lentamente se aproximava da estação espacial internacional, cumprindo as últimas ordens de uma nação que não existia mais. Em seu interior, a comandante Li Mei checava seus instrumentos novamente, como havia feito incontáveis vezes na última hora, não porque houvesse qualquer chance de erro, mas apenas para manter sua mente ocupada. Qualquer distração era bem-vinda, qualquer coisa que a fizesse não pensar no que estava acontecendo naquele instante no planeta abaixo. Ela se mantinha em silêncio, não participando do diálogo entre os outros dois tripulantes da nave. Lágrimas corriam de seus olhos e flutuavam próximas a seu rosto.
Wu Shih era o único civil a bordo, e embora fosse de descendência Chinesa, tinha nascido nos Estados Unidos e imigrado quando criança para a China na grande crise de 2030, pouco antes do colapso do bloco ocidental. Talvez por estas razões, ou por boa parte de sua família ainda estar na América, ele tentava convencer os demais que era loucura obedecer as últimas ordens que haviam recebido. Eram provavelmente as mesmas razões que faziam com que o tenente Teng mantivesse uma arma apontada para ele.
Se Teng estava de alguma forma abalado pelos acontecimentos das últimas horas, era sem dúvida o único tripulante que conseguia esconder seu nervosismo atrás de uma fachada de absoluta tranquilidade.
"Mas ele não está calmo", pensou Mei em silêncio, "está apenas em choque como todos nós. Está escondendo-se atrás de suas ordens, para não ter que parar e pensar no que está acontecendo". E Mei checou uma vez mais seus instrumentos.
- Tenente, por favor baixe a arma e reconsidere. O que vocês estão querendo fazer é loucura. Esta guerra já terminou antes mesmo de começar, e nada do que fizermos vai mudar isto - A voz de Wu Shih estava mais calma agora. Ele já havia gritado, ameaçado e implorado, sem nenhum efeito. Talvez achasse que a lógica poderia ter mais sucesso.
- Nossas ordens são claras, Doutor, e nós iremos cumpri-las, e assegurar a vitória da Nova Republica Democrática Asiática. Nossas vidas foram dedicadas a este momento, e nós não iremos falhar.
- Você não percebeu ainda? A República não existe mais. A guerra não existe mais. Olha para baixo e veja! Não deve restar uma única cidade em pé em todo o continente - Com as palavras de Wu, Li fechou os olhos por um instante, e se viu na pequena cabana de seu avô, no meio do nada, tal como ela estava da última vez que o visitou. Provavelmente ele estaria vivo ainda, longe de qualquer alvo dos mísseis, mas em breve não faria muita diferença. Nenhum lugar da terra faria diferença.
- A República existe enquanto existir um soldado para protegê-la. E se nada houver para proteger, então para vingá-la. Nós temos nossas ordens, e se pensa que os Americanos vão escapar ilesos deste crime...
- Ilesos? - e então Wu parou de falar por um instante, e recomeçou em outro tom, mais lento - você ainda não entendeu. Isto não é como a guerra de 65... Não estamos falando de um inverno nuclear ou a devastação de um continente. Este é o fim. Pergunte a Li Mei.
- Do que você está falando - E então pela primeira vez Teng se dirigiu a Li Mei, sem nunca desviar de Wu os olhos ou a arma - do que ele está falando, Comandante Mei.
E desta vez não havia instrumentos para olhar que a pudessem distrair, nada que a fizesse não pensar no que ela sabia todo o tempo.
- Se 65 serviu para alguma coisa, foi para conhecermos melhor o limite do planeta. Não faz diferença onde as bombas caíram ou deixaram de cair. A esta altura, não faz diferença quem começou, ou se irão acontecer novas explosões ou não. A Terra está prestes a se tornar inabitável - ela respondeu tudo de costas, sem olhar para eles. Só se virou no final, para concluir olhando para os dois - A humanidade vai ser extinta.
- O fim dos tempos... - Teng pareceu falar sem se dirigir a ninguém - isto não muda nada. Nós temos nossas ordens. Doutor, recolha-se a sua cabine. Comandante Mei, quero que me informe se está apta a cumprir suas ordens e destruir a estação espacial.
"O fim de toda a vida na Terra", o pensamento que Li Mei havia conseguido, até então, manter quase além de sua consciência. "O fim de tudo". Nunca mais haveria uma pessoa caminhando pela terra, nunca mais um avô, como o seu, ensinando a cavar a terra, contando histórias do passado. E os dois mísseis sob seu comando estavam apontando para o último habitat humano que restaria no universo.
- Teng
- Sim comandante - Teng desviou o olhar para ela, sem nunca deixar de apontar sua arma para Wu Shih. A dela apontava para sua cabeça.
- Eu sinto muito - Ela disse, sabendo que ele não mais podia ouvi-la. Como suas lágrimas, o sangue dele flutuava pela nave. Ela nem se lembrava de ter apertado o gatilho, de ter ouvido o som do disparo. "Choque", ela pensou, "todos nós estamos em choque".
- Doutor, entre em contato com a estação e diga que queremos acoplar. Garanta que não somos hostis - ela não podia acreditar em como sua voz soava calma, distante. Ela deveria estar histérica...
- Comandante? Você... você... - o doutor gaguejava, sem saber como continuar
- É o último lugar da humanidade, doutor, e eu não vou ser responsável pela sua destruição.
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